quarta-feira, 18 de março de 2015

O bugio dos novos tempos


Dia 15 de março de 2015, dia que entrou para a história do Brasil, com certeza. Mas como o quê? Dia em que o povo foi para rua protestar... Protestar contra o quê? Contra a corrupção em geral, contra o governo, contra o PT, contra todos os partidos existentes ou apenas contra o partidarismo fanático? Foi contra a presidente, contra o sistema político como um todo, contra o comunismo, contra o fascismo, contra a esquerda, contra a direita, contra o presidencialismo, contra a democracia, contra a república, contra a abolição da escravatura, contra a carta dos direitos humanos, contra o método do pensamento racional... Contra o quê? De certa forma, teve de tudo um pouco nessa manifestação.

É inegável que o sentimento de insatisfação e revolta do povo seja legítimo, mas garanto me valendo do mesmo método de análise que a PM utilizou para calcular o número de participantes nas manifestações, que 96% das pessoas que foram às ruas protestar não sabem, sequer, dizer a diferença na função de um vereador, um deputado e um senador; 89% não sabem dizer quais são os três poderes da República e 78% não sabem a diferença entre o presidencialismo e o parlamentarismo. Tudo se reduz à pura bugiaria. Momice transvertida de consciência política. Sentem raiva e gritam contra qualquer coisa que sirva como alvo, como um chimpanzé enraivecido que vocifera de um lado e do outro, batendo nos peitos e escancarando os dentes em disputa de dominância, como nas cenas do filme 2001: Uma Odisseia no Espaço, quando, na aurora do homem, grupos rivais de hominídeos pré-históricos “deliberam politicamente”, à maneira deles, o usufruto da poça d’água em questão. Vence a violência, claro, e o grupo que sabe utilizar a nova tecnologia do porrete de osso a seu favor.

É preciso saber reconhecer e distinguir o conceito de nação do conceito de governo, do conceito de partido, da noção de sociedade e dos demais elementos que compõe a coisa pública, antes de se pretender consertá-la. Coisa que a imensa maioria dos queridos e bem intencionados patriotas que foram às ruas protestar, não fazem a menor ideia. Sem essa consciência política, o discurso do cidadão se torna raso e seu protesto, pobre, por mais que ele esperneie e se agite. Quando grande parte dos indivíduos de uma manifestação é completamente alienada, é obvio que não predominará entre elas uma discussão política mais consistente e séria, por mais nobres que sejam suas intenções. O que resta, portanto, é um conglomerado de gente gritando junto, quando não, relinchando e sendo usada como massa de manobra. E isso vale tanto para esquerda quanto para a direita.

O que se vê na discussão atual é uma generalização banal da problemática brasileira. Rixas partidárias se mesclam com oposições em questões sociais, que se ampliam em querelas ridículas nas redes sociais (antigas mesas de bar) e tomam proporções gigantescas com a imagem errônea de que o Brasil sofre uma verdadeira cisão social e que beira a uma guerra civil entre classes... Isso é falso e artificial! Essa cisão social não é real! É apenas a expressão factícia de uma discussão política vazia e superficial, onde grupos rivais buscam se beneficiar. Nesse caminho, vencerá aquele que melhor dominar as tecnologias do porrete digital a seu favor e, claro, a violência.

Seu sentimento de indignação, caro cidadão de “bens” (ou nem tanto), é legítimo! O governo está aí para ser criticado e deve ser mesmo. Motivo para tal é o que não falta. Porém, um enorme espetáculo teatral não é composto apenas pelos artistas que estão em cena. Existe toda uma infraestrutura por trás do espetáculo, necessária para que a peça seja encenada. Não adianta apenas querer mudar o ator que está em cena se é todo o conjunto da montagem que está degringolado. E o teatro da política brasileira já vem se arruinando há muito tempo.

Não seja massa de manobra. Não seja burro servindo de montaria para oportunistas. Você pode até não se ver como uma marionete, mas existem mãos de quem se julga titereiro querendo te manipular. Ora é da esquerda, ora é da direita. No caso, desta vez, foi sim da direita. Buscaram canalizar o sentimento real de indignação popular para fins de ganho político. E conseguiram. Comparar essas manifestações de 2015 com as de 2013 é improcedente. As de 2015 foram orquestradas deliberadamente com fins não expressos de partidarismo político. Não foi uma manifestação realmente apartidária como as de 2013. Muita gente foi sim, de coração aberto e com reivindicações legítimas, mas, desculpem dizer, vocês foram usados como massa de manobra dessa vez. De uma forma menos explícita e centralizada como os movimentos de esquerda fazem e fizeram no dia 13, mas foram.


O que prejudica a discussão política no Brasil é a tendência maniqueísta e simplória de muita gente, em querer posicionar todas as questões políticas e sociais em dois únicos polos de interesses distintos e defender o seu predileto como um torcedor de futebol fanático faz pelo seu time. A raiz desse tipo de postura é a mesma que gera a corrupção no país e no mundo, ou seja, a abdicação do pensamento racional em virtude do bem comum pela justificativa do ímpeto de um desejo particular. Refletir sobre a complexidade da problemática brasileira, entre tantas outras, dá trabalho e requer um exercício de pensamento ativo e consciente, coisa que a débil educação brasileira não prepara o cidadão para fazer. O resultado é o que se vê: um monte de gente vociferando o que pensa sem saber pensar. Contudo, acredito que essas manifestações que vem acontecendo ultimamente sejam só um esboço do que ainda está por vir. Para o bem ou para o mal.

Um comentário:

Anônimo disse...

MUITO BOM